Seoldo sob o sol de Tucson, AZ, USA. |
TRADIÇÃO ORAL SOBRE 3 GRUPOS
DE EASISTAS
DA ZONA DA MATA MINEIRA
(EASISTA: Este termo aqui significa ex-seminaristas
da Escola Apostólica Santa Odília em Campo Belo. MG).
Foi um EASISTA da capital – não se sabe
qual a capital e tampouco o EASISTA – que começou a espalhar o seguinte conto, baseado
numa forte tradição oral de mais de 50 anos atrás... isto é, dos inícios do
Seminário Santa Odília dos padres crúzios em Campo Belo, MG.
(Coincidência:
a história de Cristo também só começou a ser escrita depois de 50 anos de sua
crucificação... tudo foi passado por tradição oral até este ponto). Então a tradição
é a seguinte:
Havia 3 grupos de EASISTAS bem distintos
da Zona da Mata Mineira no Seminário Santa Odília. Muitos, nestas alturas,
pensavam que Seminário é como um parque para brincar... A única coisa que
tinham em comum era o orgulho de sua origem local.
Grupo 1 – Grupo de Juiz de Fora
(inclusive Bicas)
Grupo 2 - Grupo de Senhora de Oliveira
(inclusive Senhora dos Remédios)
Grupo 3 - Grupo de Leopoldina (inclusive
Recreio, menos Miracema).
Era de se notar de longe que estes três
grupos não combinavam bem entre si: muita vaidade e ambição... que os pés de
goiabas e jabuticabas de um lugar eram melhores do que dos outros... que os limões
de um lugar eram mais azedos do que dos outros... que os cachorros de um lugar
eram menos sem vergonha do que dos outros... que eles (os cachorros) tinham
melhores olfatos para achar as cachorras perdidas do que dos outros... E por aí
seguiam discutindo/brigando com palavrões o tempo todo. Além das lorotas
vaidosas, havia muitos xingamentos feios, muitos empurrões, beliscões,
trombadinhas de propósito, calços no pé de trás quando se saía da capela e nos
corredores, e, sobretudo, aqueles 'pecadinhos' de passar a mão por detrás na b...
e quando se descuidava um pouquinho aqui e ali... e muitos peidinhos fedorentos
quando apareciam as oportunidades (durante as horas de estudo e de noite depois
que Padre Marino apagava as luzes, e mesmo nas horas de recreio sem menos
esperar). Era só catimba pra lá e pra cá de um grupo contra os outros... Padre Marino observava tudo aquilo caladinho,
com o olhar de um corujão resignado, pois havia muitos padres disponíveis para
ouvir as confissões desses 'pecadinhos’... - incluindo aqui 'os maus
pensamentos' - (o falecido Padre Luís
morria de rir quando chegava sua vez de ouvir as confissões!).
Porém, o ambiente entre estes três grupos
foi ficando cada vez mais tenso e carregado de magnetismo, e a coisa foi
complicando-se de mal para pior: muita briga com bordoadas pra valer... Chegou
ao ponto de o Padre Marino, após consultar-se com o Padre Clemente, e com a
aprovação do Padre Lucas, ter selecionado 4 'capetas' representantes de cada
grupo:
Grupo 1 de Juiz de Fora: Arnaldo,
Alfredo, Benone; reserva: Vicentão.
Grupo 2 de Senhora de Oliveira: João
Saturnino, Rosalino, Ildeu; reserva: Canhão.
Grupo 3 de Leopoldina: Zé Geraldo, Lydio,
Carlinhos; reserva: Edmundo.
Padre Marino primeiro alugou um ônibus de
assentos duros, e com os 3 grupos partiram juntos para o litoral e foram sair
lá em Porto Seguro, no Recôncavo Baiano (território que deveria pertencer aos
mineiros; talvez um dia...). De lá,
alugou uma velha balsa importada de Belém do Pará, e foram encalhar numa ilha
chamada – conforme a tradição dos mais velhos -Marteinz Veinz, uma Irma gêmea
da Martins Vaz. Despejou os 3 grupos lá e disse-lhes: que se virem e revirem!
Na ilha só havia uns poucos pés de coco,
muitos morcegos chupadores de sangue, algumas lagartixas rajadas, gaivotas
bicudas, aqui e ali caranguejos tortos, e muitas latas e garrafas vazias... O
resto era só areia, pedras e uns lixos podres que iam chegando do Mar dos
Sargaços... Claro, aí sim é que aumentou
a safadeza entre os grupos... Até que um
dia chegaram à conclusão por unanimidade que o certo era que EASISTA DEVIA
RESPEITAR UM AO OUTRO conforme ditava o Sermão da Montanha e o mandamento do
deserto... Então era abraços pra lá e abraços (não beijos) pra cá. Começaram a
se afinar em tudo direitinho com muito respeito e educação um para com os
outros; por exemplo: quando um precisava fazer uma necessidade biológica (isto
é, uma cagada boa) devia afastar-se para longe e esconder-se, etc.
Num belo dia sem ventos e tempestades, um
deles (a tradição fortemente indica que foi o Rosalino) avistou uma garrafa
boiando por perto e ele logo pulou na água para agarrá-la e assim aumentar sua coleção
que já estava bem avançadinha... Deparou, todavia, com que havia algo estranho
dentro da garrafa em um envelope de plástico, e também que a garrafa era meio
protegida por uma casca de bananeira (tipo a Germana atual). Rosalino, muito
assanhado, pegou a garrafa e saiu correndo em direção aos grupos que, nestas
alturas, estavam concentrados ouvindo a piada do mineiro, do gaúcho e do
paulista... Todos se concentraram agora na garrafa e depois na mensagem, muito
curiosos. Porém, outra vez, o problema era quem iria ler a mensagem?! Começaram
o jogo de porrinha... Primeiro, quem seriam os dois primeiros e assim por
diante... Veio a noite e não se chegara a um finalista... Decidiram continuar
na madrugada... Foi muito divertido o jogo de porrinha! Finalmente apareceu o
ganhador, aquele que iria oficialmente ler a mensagem (se não estivesse em
latim):
O A L F R E D O ! ! !
Porém, sem demora, começaram os protestos
contra o Alfredo, que, nestas alturas, parecia mais uma toalha amassada:
-
que o Alfredo tinha a voz de vendedor de remédios... até ajudou no nome
de Senhora dos Remédios;
-
que o Alfredo grita com voz retumbante e esperneia quando o ônibus está
lotado;
-
que o Alfredo tinha a voz de pato rouco de tanto rezar as penitências de
seus pecadinhos depois das confissões;
-
que a voz do Alfredo estragou-se bastante também de tanto falar/cochichar
de noite com seu travesseiro... (aprendeu com o Toinzé);
-
que a voz do Alfredo se estragou um pouco depois que começou fumar aqueles
‘cigarros dos padres’ influenciado pelo Arnaldo;
-
que a voz do Alfredo parecia um murmúrio da 'Mula sem Cabeça' nas noites
sem lua;
-
que o Alfredo não deveria desgastar muito sua voz, pois iria precisar
dela no futuro para discutir com ambulantes e pequenos produtores/criadores/agricultores
sobre arrecadações de impostos;
-
que a voz do Alfredo tinha o sotaque dos tropeiros, a quem ele se
juntava, para vender seus remédios de porão;
-
que a voz do Alfredo não era apropriada para este ambiente marítimo, mas
sim para o mundo interior de Minas nas sombras das estatuas do Aleijadinho;
-
que a voz do Alfredo, às vezes, combinava com a do Sapo-Boi-Cururu sendo
muito monótona e sem graça... talvez ela servisse para espantar grilos mal-educados;
-
que o Alfredo nem sabia pronunciar a palavra GOL direito... sempre dizia
GOLE... GOLE...GOLE... mais um GOLE!;
-
que a voz do Alfredo se desarranjou de tanto gritar 'meu Deus, meu Deus,
por que me abandonastes?… depois de tanto cair nos jogos/peladas e acrescentava
ainda na sua súplica: 'por favor, Deus, eliminai a Lei da Gravidade nos campos onde
estou jogando bola'.
E seguia por aí a ladainha de protestos contra a indicação
do Alfredo... Chegou a um ponto em que todos concordaram: ELIMINARAM O ALFREDO POR CAUSA DA SUA VOZ (no
final haverá mais comentários sobre este assunto).
Resolveram substituí-lo, sem reclamações,
como sempre acontecia nos campos de jogos/peladas... Depois de dar um empurrão
no Vicentão, o Acelerado Benone, com voz de futuro vendedor de
sapatos/alpercatas para moleques, abriu a boca e anunciou, piscando o olho
esquerdo: CADA GRUPO SÓ TEM UM DESEJO ÚNICO (assinado por Padre Marino).
Levaram mais dois dias
jogando porrinha para determinar qual grupo iria primeiro, segundo e terceiro,
e também quem seria o leitor de cada grupo com relação ao 'desejo'. Pois bem,
para fazer esta 'Tradição Oral' menos longa e menos cheia de zigue-zagues, e
para evitar muita falação sem PÉ nem cabeça, ficou a ordem dos grupos assim:
-
Primeiro:
Grupo de JF ---- orador: Vicentão (que tinha voz tipo comandante da Arca de Noé);
-
Segundo:
Grupo de SO ---- orador: João Saturnino (que tinha a voz do deus Saturno);
-
Terceiro: Grupo
de LEO --- orador: Edmundo (que teria a voz de fazer subir e abaixar aviões).
Porém, foram todos dormir,
porque começou uma chuvinha enjoada e fria vinda do sul, isto é, do Continente
Antártico (onde só tem pinguins, etc...). De manhã cedo, depois de pentearem os
cabelos com os dedos, mesmo em jejum, todos estavam alertas, curiosos e
animados para o que desse e viesse...
Então o orador Vicentão
pediu a palavra e a atenção de todos, porque já estavam começando a desmoralizar...
Tentou e falou com uma voz não muito impressionante: o nosso desejo é: VOLTAR
IMEDIATAMENTE PARA O SEMINÁRIO SANTA ODÍLIA e estudar muito sem briguinhas... B
U M !.... ZUN!... Passou como que um relâmpago cósmico, arrebatou-os e foram
aparecer sentados na sala de estudos e logo começaram a fazer o dever de tradução
de latim dado pelo Padre Lucas...
Em seguida veio a vez do
Grupo de SO. O orador João Saturnino (cujo nome, conforme a tradição, parece
ter sido sugerido pelo Zeus Júpiter encarnado em murundus de cupins) adiantou-se
e com a boca um pouco torta, imitando uma estátua do Aleijadinho, despejou sem
respirar: o desejo do nosso grupo é VOLTAR IMEDIATAMENTE PARA O SEMINÁRIO SANTA
ODÍLIA e ir para a sala de recreio... B U M!... Z U N!... O mesmo relâmpago galáctico
os arrebanhou, e (conforme a tradição) foram aparecer sentados naqueles
banquinhos do lado de fora da sala de recreio, cortando os cabelos uns dos
outros, bem como, aproveitando a oportunidade, catando um piolho aqui e ali... tudo
dentro de um clima pacifico e respeitoso mesmo sob as gozações de alguns
plebeus biscoiteiros...
Foi então que chegou a vez
do último Grupo de LEO... Notou-se que esse grupo parecia muito triste e até
mesmo com os olhos um pouco molhados de lágrimas (de jacaré), e sobretudo
inquieto... Pois Zé Geraldo não parava de coçar o saco... O Lydio só assoando o
nariz de um lado e de outro... O Pandeló soltando uns PUNS fedorentos... Mas o
quietinho Edmundo, com sua voz de fazer aviões pedirem licença, anunciou bem
claro, olhando para as nuvens: o nosso desejo é... é... é que OS GRUPOS DE JUIZ
DE FORA E DE SENHORA DE OLIVEIRA VOLTEM IMEDIATAMENTE PARA CÁ, PARA ESTA ADORÁVEL
ILHA, onde não precisamos estudar-rezar-trabalhar-confessar nossos pecadinhos...
Ademais, estamos já com muitas saudades deles! B U M!...B U M!
...Z U N!... Z U N!...
Lá voltaram os grupos para a Ilha Marteinz Veinz... E outra vez começaram
as braçadas, os xingamentos feios e tudo o mais...
Conforme a tradição, nenhum
deles virou santo nem terminou o seminário menor. Todos cresceram e
multiplicaram-se adequadamente...
(Esta tradição oral
ainda está sendo passada de geração em geração... Agora precisamos de um
estudioso para averiguar os detalhes sem deixar-se levar pelas emoções).
EASISTA FIEL: Geraldo Hélcio
Seoldo Rodrigues – 75 anos de idade – vivendo no meio dos cactos dos desertos
de Arizona, com barba e, às vezes, usando bengala.