Entrevistado: Tupinambá Pedro Paraguassú Amorim da Silva (68 anos)
Período no seminário: 1963-1964 (EASO – Campo Belo); 1965 – 1971 (Seminário Maior – BH).
Formação acadêmica: Filosofia – História - Teologia - Administração de Empresas – Ecologia e Educação Ambiental.
APRESENTAÇÃO
Tupy, nome reduzido pelo qual é mais conhecido, é esse homem de fé, irmão, camarada. Descendente de índio misturado com europeu, herança que lhe deu essa mescla genuína na tez e no porte físico.
Filho comportado, acatou a decisão da mãe e seguiu seu desejo: entrou no seminário menor disposto a ser padre. Todavia, concepções divergentes no trabalho apostólico, já no diaconato, levaram-no a deixar a vida religiosa.
Será que a Marina teve algo a ver com essa decisão? Isso ele não disse nem lhe foi perguntado. Uma coisa é certa: casaram-se dois anos depois dessa decisão, em 1973, formando uma bela família, que foi abençoada com dois filhos e dois netos, por enquanto. Mesmo depois de aposentados, o casal ainda comunga muitos sonhos e projetos de vida!
Homem simples, mas também corajoso. Não se submete à injustiça e enfrenta os poderosos nos seus tronos, assim como fez, enfrentando a polícia na década de 1970, dando assistência aos presos políticos e perseguidos da (in)justiça.
O seu testemunho de fé é um exemplo para todos nós: como ele não se envergonha do Mestre, com certeza, o Mestre também não se envergonhará dele no último dia.
Este é o nosso amigo Tupy, que, diferente da maioria de nós outros, chegou já grande no Seminário da Escola Apostólica “Santa Odília” (EASO).
Prezado leitor, conheça melhor a grandeza desse homem na entrevista a seguir e preste atenção às suas mensagens que nos fazem refletir.
I – PERFIL
Família: casado com Marina Terezinha Rigotto da Silva, Assistente Social aposentada, natural de Belo Horizonte. O casamento realizou-se em Sabará no dia 14/07/73, na Capela de São Pedro Damião.
Dessa feliz união foram gerados dois filhos: o mais velho, de nome Lucas Tadeu Rigotto da Silva, casado com a paulista Carla, que tiveram como fruto desse casamento o neto Lucas. O outro é o Matheus José Rigotto da Silva, casado com a mineira Simone, que geraram o neto Matheusinho.
II - DEPOIMENTO DO ENTREVISTADO
Ainda me chamo Tupinambá Pedro Paraguassú (com dois ‘ss' e acento agudo no ‘u’) Amorim da Silva. Sou natural da antiga “Cidade das Mangueiras”, Belém do Pará, nascido aos 28 dias do mês de junho do ano de 1944. Fui criado no Bairro da Pedreira, “Bairro do Samba e do amor”, cuja padroeira é Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Fui batizado na Basílica de Nossa Senhora de Nazaré.
Meu pai, Sebastião José da Silva, de origem escrava e indígena, é proveniente da Ilha do Mosqueiro. Minha mãe, Carmem Amorim da Silva, de origem portuguesa e francesa. Dessa mistura toda vim ao mundo, belo, sadio e sacudido. Oficialmente consta que tive mais sete irmãos, ao todo, seis homens e duas mulheres. Eu sou o penúltimo da prole. Meus pais, como também outros quatro irmãos, já estão no andar de cima. Hoje somos apenas duas irmãs e dois irmãos. Exceto eu, todos vivem com suas famílias em Belém do Pará e na ilha do Mosqueiro.
Minha ligação com os “Crúzios” não difere tanto da de nossos companheiros de seminário. Aos sete anos, recebi o Sacramento da Eucaristia (nem sabia o que era bem isso!). Dado ao meu espírito moleque, brincalhão, porém muito sério, logo fui ser coroinha e entrar para a “Cruzada Eucarística” (CE). Imagine, fui “cruzadinho” e depois presidente da CE. Na minha paróquia fui escoteiro, legionário, do Grupo de Jovens e etc e tal. Não sabia que estava sendo observado. Padre Henrique Plag, padre Hilário de Yong, padre Tiago Boets, padre Andrezinho (“Driske”), padre Guilherme Lokkant e Padre Gilberto van de Ven foram os meus preceptores na Ordem de Santa Cruz (OSC). Padre Arnaldo van Kuyk, superior da Ordem no Brasil, um dia, em visita canônica, esteve em Belém e apresentaram-me a ele. Perguntou-me se gostaria de conhecer o Seminário de Campo Belo. Não soube responder. “Que conversassem com a mamãe!”. Foi um rolo. Estava já terminando a 8ª série do 1º grau no Ginásio “Visconde de Sousa Franco”. Papai nem quis ouvir. Mamãe mandou pensar. E pensando, os padres me colocaram para estudar com os Maristas no Colégio Nazaré. Lá, em 1962, cursei a primeira série do 2º grau. Após muita relutância de papai, minha mãe deu o veredicto: “pode ir! Vá com Deus!"
Em pé, a partir da esquerda, Avimar, Tupy, Carraro,
Nonato, Edmar. Júlio Martins (primeiro agachado, à esquerda
Foto cedida por Rodolfo Rodarte
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No dia 13 de fevereiro de 1963, saí de Belém em um avião da Panair do Brasil, junto com o Raimundinho (por onde ele andará?). No dia 14 de fevereiro, cheguei a Campo Belo. Dessa “Cidade Montesa”, saí no final de 1964 para dar continuidade à formação eclesiástica no Noviciado. Deixei a OSC em 1971.
Onde trabalhei?
Antes mesmo de deixar a OSC, eu já trabalhava em uma escola da periferia de Belo Horizonte, no bairro Boa Vista, lá pelos idos do ano de 1966: Colégio Normal “Frederico Ozanam”, mantido pela Associação de Negros “Henrique Dias”, fundada para dar suporte aos negros e filhos de negros, já discriminados naquela época. Fui professor de Filosofia-Sociologia-Psicologia da Educação; professor da área de Estudos Sociais (História Geral, História do Brasil, Educação Moral e Cívica, OSPB). A princípio minha atividade maior era acompanhar e dar assistência aos jovens e às futuras professoras. Dado à insuficiência de técnicos educacionais e pelo meu destaque no trato com alunos, pais de alunos, professores e comunidade, logo fui assumindo as funções de Diretor Técnico, Orientador Pedagógico, Orientador Educacional e Relações Públicas, pois muitos dos diretores eram semianalfabetos. Foi uma experiência maravilhosa. Ali pude ver o quanto uma pessoa cheia de boa vontade pode fazer por seus semelhantes. Nesse Colégio implantamos os cursos de Secretariado, Técnico em Administração de Empresas, Contabilidade, e Enfermagem. O Eustáquio pode dar testemunho dessa fase. Por questões de ordem pessoal e de futuro de lá saí em 1976.
Atuei também como professor, Diretor e Coordenador Pedagógico no Colégio “Claudovino de Carvalho”, depois denominado “Santa Inês” e agora conhecido como “Colégio Maximus”. Praticamente fizemos um trabalho semelhante ao anterior.
Não deixei de estudar e, nesse intervalo de tempo, completei meus estudos filosóficos em São João d’El Rei. Formei-me em Administração de Empresas pela Faculdade de Ciências Gerenciais da UNA (FCG/UNA). Como sempre só pensando na docência, mas lá fui eu, logo depois de formado, devido às experiências anteriores, assumir a Coordenação Geral de Ensino da UNA, depois a Secretaria Geral, depois a Vice-diretoria, depois a Coordenação do Vestibular; tempos depois colaborar na implantação dos cursos de Comércio Exterior, Processamento de Dados. Isto tudo, mais uma vez digo, por causa do meu espírito alegre, amigo de todos, cumpridor de meus deveres, firme nas decisões e sem “puxar saco” de quem quer fosse.
Não satisfeito com o que já sabia, em Lavras fiz o curso de “Ecologia e Educação Ambiental”. Foi mais uma porta aberta para o magistério. Assim, lá fui eu para Itabira colaborar na oficialização do curso de Turismo e dar aulas de Recursos Humanos, Ética Profissional (Deontologia). Foi uma loucura, mas deu certo.
Hoje sou um aposentado feliz e quase realizado profissionalmente.
O que realizei fora do emprego?
Ainda achava tempo para ajudar nas paróquias na formação e coordenação da Catequese e na formação de Associações de Bairros. Eram comunidades emergentes, não havia saneamento básico; faltavam escolas; condução precária; inexistiam Postos Médicos, etc, etc.
Tupy servindo a sopa, em destaque, à esquerda,
Nonato e Carraro (de óculos) - Foto cedida por Nonato |
Ora, no mundo, a vida consta de uma sucessão de fatos e estes fizeram parte na minha vida.
No espaço de tempo de 1966 a 1970, participei de manifestações estudantis e confronto com as Polícias Militar e Exército, apanhei de cassetete, as bombas de gás lacrimogêneo me faziam chorar e correr. Fui por algumas vezes levado no “camburão” junto com outros estudantes e solto após levar algumas lambadas nas costas (‘solta eles, mas dá umas porretadas neles, pra aprender’); estava no “meio da multidão”. Ainda como Crúzio e vestido de Crúzio, visitava presos políticos no DOPS e nas Delegacias de Polícia. Parece que eu “acendia uma vela pra Deus e outra pro Diabo”. Assim fiz até que foram descobrindo minhas atividades. Aqui também começou a minha divergência com a direção da OSC: queriam um Crúzio conventual e eu estava mais fora do que dentro do convento. Era o vigor da juventude brasileira, a força intrínseca do nacionalismo, contra o tradicionalismo europeu de formação; quiseram mandar-me para a Alemanha ou Roma, mas não aceitei. Na oportunidade, achava que não podia deixar o nosso povo. Mesmo assim, cheguei ao Diaconato. Assim batizava crianças, celebrava casamentos, visitava doentes em suas casas e nos hospitais, ia a velórios, participava de cultos ecumênicos, ia aos terreiros e ainda celebrava cultos na ausência de padres, tanto em nossas paróquias quanto na periferia, etc., etc. O mais importante e gostoso era contribuir para levar nosso povo a ter uma melhor condição de vida tanto espiritual como social, pessoal e comunitária. Por um tempo fui Conselheiro do Conselho Regional de Administração (CRA/MG) e um dos autores do Código de Ética do Administrador. Hoje, como aposentado, continuo fazendo tudo isso e muito mais. Junto com a Marina, esposa querida, somos membros do Conselho Municipal do Idoso de Sabará (imagina que cheguei a ser presidente deste Conselho); coordenamos o Grupo da Melhor Idade “Alegria da Abranês” da nossa comunidade; participamos do Encontro de Casais com Cristo; fazemos parte do Conselho Pastoral da comunidade; somos membros do Apostolado da Oração, da SSVP, Conferência “Santa Helena” e outras coisas mais.
Hobby?
Quando podemos, viajar: Belém; São Paulo para ver o netinho Bruno, o filhão e a nora querida; Campo Belo, Leopoldina, Juiz de Fora para ver os amigos; algumas vezes ao Nordeste. Leitura diária de jornais, revistas. Livros técnicos na área de Relações Humanas e religiosos, romances, poesia e contos. Tudo pela metade, não dá tempo para ler tudo. Gosto de ver futebol pela TV, principalmente do meu GALO e do meu querido REMO. Estou sempre ligado às notícias vindas por meio do rádio. As novelas que apresentam um razoável enredo me agradam.
O que penso dos dias atuais?
Vejo grandes vertentes: a grande preocupação com a qualidade de vida do planeta Terra e das pessoas que nele habitam. Em face disso, congratulo-me com as políticas internacionais em favor da ecologia sem que com isso diminua o processo de desenvolvimento industrial, a preocupação com a valorização do ser humano dentro desse processo todo ainda seria ínfimo, mas que está aí.
Por outro lado, a ganância, o desejo de ser mais, de manter posições estratégicas no rol das nações, leva muitos países a não ver, não querer que a visão anterior se realize e assim vêm as consequências nefastas como as guerras fratricidas, as guerras religiosas, a devastação das riquezas naturais; a fabricação e vendas de armas bélicas com efeitos altamente destruidores. No campo social a luta para a legalização do aborto em todas as situações; a desvalorização e desagregação da família; a relação estável e oficial de pessoas do mesmo sexo; a luta pela dessacralização, pelo descrédito às instituições religiosas e à cultura religiosa em geral. E os efeitos nefastos da globalização no que tange às culturas nacionais, o folclore, as festas tradicionais, os festejos religiosos, as serestas, as brincadeiras e cantos infantis, o amor aos símbolos nacionais. Nossa, é muita coisa. Mas, nada está perdido. O mundo está vendo, está sofrendo e está se revoltando contra este estado de coisas.
O que pretendo do futuro?
Como bom cristão, afirmo: “O futuro a Deus pertence”. O passado é a fonte da experiência. O presente é para ser vivido. Vivido de forma integral de corpo e alma. Lutando para que a condição melhor de vida se torne uma regra e não uma exceção. “Eu vim para que todos tenham vida e todos tenham vida plenamente”. A parusia começa no momento de nossa existência e se prolonga sempre (há quem acredite que começa após a morte apenas). Eternidade, acredito, não tem início nem fim. Ela é no aqui e no agora (no hic et nunc). Como daqui a cinquenta anos não deverei estar mais aqui e sim em outra esfera, fico com a promessa daquele Senhor que ontem, como hoje nos promete: “Não se perturbem os vossos corações. Creiam em mim, creiam no Evangelho!”, assim vou vivendo, pois sei que “Na casa de meu Pai há muitas moradas!”, assumi a Palavra e lutarei até o fim para que uma delas seja a minha. E, quem sabe, de lá poder, se me for permitido, ver a concretização desse “mundo de amor e paz”, que só Ele pode dar!
É o que penso, mesmo contrariando uns e outros.
Acredito que a trajetória de minha vida tem muito a ver com a presença dos Crúzios na minha vida. Presença esta que vem desde a minha meninice, adolescência e parte da juventude vivida na Paróquia de Nossa Senhora Aparecida, lá na minha querida Belém do Pará, no saudoso bairro da Pedreira; no tempo vivido na Escola Apostólica Santa Odília, no Convento São José em Leopoldina e no Convento de Belo Horizonte em Santa Tereza. Todos os Padres Crúzios, bem como todos os companheiros de seminário, com certeza, não só influenciaram a minha vida como me fizeram ser o homem que sou.
III – PERGUNTAS GERAIS
Blog – Fazendo uma retrospectiva da vida e do ser humano que você é atualmente, o que a Escola Apostólica Santa Odília significou neste contexto? Qual a importância ela teve para você?
Tupy – O sentido de poder viver na unidade dentro de uma diversidade de pessoas provindas de regiões diversas; idades diferentes: crianças, adolescentes, jovens; com intelectuais como os Padres Crúzios, professores do Colégio “Dom Cabral”. Todos esses aspectos contribuíram para moldar meus pensamentos, atitudes de vida, adaptabilidade, o espírito de disciplina, aprofundamento da cultura, da ciência e da espiritualidade.
Blog - Quais as lembranças que você tem da EASO e das pessoas com as quais conviveu lá que são as mais marcantes e significativas para você?
Tupy (à direita) ao lado do Carraro e dois
alunos externos do "D. Cabral" (agachados)
Foto cedida por Júlio Martins
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Blog – Para você, o que é ser bem sucedido na vida?
Tupy - Filosoficamente: buscar constantemente o sentido da vida em cada fase da existência. Como criança, pensava como criança e o mesmo fiz na juventude e na fase adulta, pensando, respectivamente, como jovem e adulto. E agora, na fase madura da vida, olhar para trás e ver se o que fiz me responderá “para onde vou”.
Racionalmente: “Lutar, lutar, vencer, este é o nosso ideal”. O sucesso depende de como você vê a vida, como você a enfrenta e o que você faz para conviver com a diversidade, sem perder a sua individualidade e a sua dignidade como ser humano.
Espiritualmente:– “Eu creio na vida eterna e na feliz ressurreição!”. “Eu creio num mundo novo, pois Cristo ressuscitou! Eu vejo sua luz no povo, por isso alegre estou! Eu creio nos homens que estão unidos com outros, partindo o pão. Nos fracos fortalecidos, eu vejo a ressurreição! Na fé dos que estão sofrendo, no riso do meu irmão, na hora em que está morrendo, eu vejo a ressurreição”.
IV – PERGUNTAS ESPECÍFICAS
Blog – Qual a origem de seu nome? E por que você foi batizado na Basílica Nossa Senhora de Nazaré e não na paróquia do Bairro da Pedreira, onde nasceu?
Tupy – Tupinambá Paraguassu. Meu pai, católico daqueles muito ecléticos, acreditava muito em Deus, mas buscava ajuda espiritual onde lhe fosse mais convincente. Estava eu para nascer, mamãe passando muito mal, então, recomendaram-lhe uma visita a um Centro Espírita. Lá foi ele, pois o amor para com mamãe levava-o a buscar todo tipo de ajuda. Gente, “baixou um caboclo”. Seu nome? Tupinambá Paraguassú. Este recomendou umas garrafadas naturais. Se mamãe tomasse, ficaria bem e o filho nasceria bem e sem problemas. Não deu outra, mamãe tomou. Coincidência ou não, mamãe não teve mais nada e eu vim a este mundo, sadio, lindo e maravilhoso, como sou até hoje (um pouco melhor, é claro). Papai foi agradecer. Sabem qual o pagamento? Dar ao filho nascido o nome do índio: Tupinambá Paraguassú. Papai nem pestanejou.
Era comum batizar primeiro (ou seja, logo). Na Pedreira o padre não aceitou batizar o “beleza aqui” só com nome de índio. Na Basílica de Nazaré o padre foi mais acessível e argumentou com papai que, uma vez que eu nascera nas vésperas de São Pedro, que eu fosse batizado com um nome que fosse cristão. Beleza. Tudo em paz! Na Basílica recebi o sal, tomei banho na pia batismal e ainda colocaram uma vela acessa na minha mão e com um novo nome: Pedro Tupinambá Paraguassú Amorim (da mamãe, descendente de francês com português) e da Silva (da parte de papai).
Tupinambá Pedro Paraguassú Amorim da Silva um pouco mais atual (I Encontro - 2008) - foto extraída do Google Drive do Luiz Alfenas |
No Cartório: não se sabe se foi gosto do papai, gosto ou erro do escrivão. Recebi outro nome: Tupinambá Pedro Paraguassú Amorim da Silva. Este sou eu. Acredite quem quiser!
Blog (sugerida por Luiz Alfenas) – Tupy, por que você diz que os negros e filhos de negros já eram discriminados em 1966, como se no passado mais remoto não houvesse tal discriminação. Não seria o caso de se dizer: ainda eram discriminados naquela época?
Tupy: Correto. A história se mantém até hoje. Veja o caso da discriminação em empregos, cargos políticos, vagas em Universidades, etc... Acontece que, na periferia onde eu trabalhava como “agente pastoral”, o êxodo rural era uma constante. A maioria dos retirantes era descendente de negros e nas escolas a preferência era para os filhos de brancos. Pouca vaga sobrava para os filhos dos negros e dos marginalizados. A minha fala refere-se ao contexto em que estava situado. Desculpe-me a falta de informação.
Blog (sugerida por Luiz Alfenas) – Na descrição de sua participação em manifestações estudantis e nas atividades de apoio aos presos políticos, no período de 1966 a 1970, você diz que “acendia uma vela para Deus e outra pro Diabo”, quem era o Diabo no contexto descrito?
Tupy – Como religioso e envergando a “farda crúzia” eu entrava nas Delegacias e visitava os presos. No meio das manifestações eu era o civil engajado. A frase descrita foi apenas uma forma de expressão.
Blog (sugerida por Luiz Alfenas) – Em seu depoimento, você se considera um aposentado feliz e quase realizado profissionalmente. O que você quer dizer com quase realizado profissionalmente, o que lhe falta?
Tupy – O ser humano nunca se encontra totalmente realizado. Acredito que enquanto na ativa jamais deixei de cumprir um só ato que desabonasse a conduta profissional. Talvez tenha me expressado mal. O desejo de ser, mais a ânsia de querer saber mais, e a observância de nossas limitações de agora, levam-me a ver que “sei que nada sei”. Por isso, procuro aprender sempre mais e mais e, assim, vou me realizando.
Blog (sugerida por José Tito) - Você acha que a inserção social de ex-internos de colégios católicos, hoje, está mais fácil com o tipo de formação que tivemos?
Tupy – Não tenho informações suficientes para responder a essa pergunta. Posso apenas concluir que as dificuldades são as mesmas para cada um que procura “seu lugar no mundo”. Quando a formação é integral e a instituição bem reconhecida, isso torna-se um facilitador. Tudo depende de cada um, veja nosso caso: quantas dificuldades tivemos. Sobrevivemos e hoje estamos aí.
A seguir, quatro perguntas sugeridas pelo José Rafael:
Blog - Sua atuação no meio social é clara, você se dedica muito ao próximo, faz parte de sua vida o trabalho comunitário. Sendo assim, explorando um pouco mais, perguntamos: como você vê o trabalho atual da "Igreja", no tocante às mudanças sociais que necessitam ser realizadas, nos aspectos político, social e familiar?
Tupy – A Igreja Católica Apostólica Romana, a nossa Igreja, está situada dentro de um extenso mundo: em todos os rincões da terra. Em cada parte uma realidade diferente. A mensagem evangélica é a mesma em todo e qualquer lugar. O trabalho, a missão da Igreja é colaborar para que todos vivam sob a égide da justiça e da paz acentuando que o desenvolvimento é o novo nome da paz. Paz e desenvolvimento no sentido político, econômico, social familiar e religioso. Toda e qualquer ação missionária neste sentido fatalmente conduz à mudança. Isso é notório nas comunidades. O que diferencia, em nosso caso, é que o Brasil é um “gigante pela própria natureza”, com condições diferentes de vida e de problemas de todas as ordens. Isso dificulta uma ação plenamente conjunta. Veja o caso da ação no Norte e no Nordeste, como difere da ação da Igreja presente no Sul e no Sudeste. Considero que a Igreja Católica e algumas evangélicas estão fazendo um trabalho de evangelização que busca uma renovação na política como um todo. Face a isso, muitos de nossos missionários são perseguidos e mortos junto com tantos outros agentes pastorais.
Blog - A fé é algo muito pessoal, no entanto, recebemos influências externas que podem solidificá-la em cada um de nós. Perguntamos: até quando os crúzios tiveram influência na sua fé? Há um fato específico?
Tupy - A fé é algo pessoal porque se trata de uma adesão a alguém, a uma ideia ou a determinado grupo para onde convergem pensamentos e ações semelhantes. No nosso aspecto religioso, a fé está centrada na pessoa de Jesus Cristo, nos seus ensinamentos e em suas ações. Não no Jesus Cristo Histórico, que viveu e fez assim e assim, mas no Jesus Cristo concreto que vive e está no meio de nós. De forma que, por não sermos perfeitos nem donos da verdade, sempre estaremos recebendo influências externas, as quais servirão para solidificar a crença naquilo que professamos. Assim foi com nossos queridos Padres Crúzios. A vida monástica deles e suas ações pastorais, podem ter certeza, influenciaram e continuam influenciando na minha vida, especialmente os “crúzios idosos” que vivem reclusos em determinados conventos e não se queixam do modo como vivem hoje. Venham visitá-los em Santa Teresa, Belo Horizonte.
Blog - Você e o Eustáquio são dois educadores. A O.S.C. acertadamente chamou Eustáquio para dirigir o Colégio “Dom Cabral”. Pelo seu currículo, você também poderia dar uma grande contribuição para a obra. Se lhe fosse solicitado, como você poderia colaborar com o nosso querido colégio?
Tupy – Meu ciclo de vida como educador profissional encerrou-se quando da minha aposentadoria definitiva. Nossa contribuição chama-se presença. Estou constantemente presente e trocando ideias com nosso Eustáquio. Não me passa mais pela cabeça assumir posto algum de direção em nenhum estabelecimento de ensino.
Blog - O que você tem a dizer sobre os nossos "encontros" (EASO)? Você tem alguma sugestão a fazer para melhorar este movimento?
Tupy – Gosto de dissertar sobre isso. Foi a melhor das ideias que um ou mais dos antigos internos da Escola Apostólica “Santa Odília” puderam ter. Pensar, sempre pensei. Buscar, nunca busquei. Daí, desde cedo assumi a proposta. Coloquei-me ao lado do Rafael, do Raimundo e da turma de Juiz de Fora, de Belo Horizonte e dos demais idealizadores para colocar a idéia para frente. Assim foi. Hoje é uma realidade. Uma grande realidade. Uma santa realidade. É maravilhoso reencontrar amigos, ver as esposas se conhecendo, conversando animadamente como se já conhecessem pessoalmente. Filhos e netos, quem diria que um dia pudessem saber mais de perto como foi a formação de seus pais e avós.
Sugestão? Uma só: NÃO DEIXAR QUE ESSE MOMENTO MARAVILHOSO SE PERCA.
TUDO FAZER PARA QUE MUITOS E MUITOS ENCONTROS SE REALIZEM!
Blog – Qual mensagem você gostaria de deixar para os leitores do nosso Blog?
Tupy – Não esperar ser convidado. Participar do Blog: ler, enviar fotos, crônicas. Contar um pouco de sua vida. Fazer-se presente nos Encontros. Divulgar impressões.
“Um abraço de paz. Um abraço de irmão. Um abraço que vá alegrar seu coração. Paz para você, paz para nós. Paz para o mundo!”. Pelo que somos, onde haja dor, tristeza ou melancolia, que possamos levar a paz!
Tupy e Marina – Sabará – tupypedro@yahoo.com.br
Ei Tupy!
ResponderExcluirMuito boa sua entrevista,legal conhecer um pouco sobre a vida dos irmãos mais velhos. você é um exemplo para todos nós.
Como costuma dizer o Nonato: Você é o cara. Um grande abraço para você e a Marina.
Olá Tupy ! Você fala em legalização do aborto. Não ficou claro, para mim, sua posição sobre o assunto. Quero te cumprimentar pelo trabalho social, desenvolvido ao longo de sua vida. Homens como voce é que fazem a diferença no mundo em que vivemos. Parabéns, meu caro Tupy, a voce e sua esposa. Um abraço, junto como o meu mais expressivo desejo de um 2013 com muita paz. Benone
ResponderExcluirIrmao Tupy! Muito aberta e sincera sua entrevista...caminho longo, caminho bonito, tambem com muita poeira. Muitas indecisoes e muitas decisoes sob sufoco...Mas voce permaneceu firme... continuou abracando todo mundo, abracou Marina, virou papai, virou vovo... Toma um pouco mais de cuidado agora... os cabelos estao mais brancos. Mais devagar ai em Sabara!!!Abracos de Seoldo.Um 2013 com mais calma!
ResponderExcluirTive a honra de ser aluno desse grande homem.
ResponderExcluirEu também tive a honra de conhecê-lo, bem como gozar das boas conversas que tínhamos quando frequentava à sua residência. Isso tudo, na época e na qualidade de amigo de seu filho Lucas lá por 1993....bons tempos..eu Gildo, com William, Lucas e Matheus
ResponderExcluirGrande Professor Tupy, fui aluno dele no colégio Claudovino de Carvalho.
ResponderExcluirFui aluna dele no colégio Santa Inês, muito legal conhecer a historia dele.
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